domingo, 23 de outubro de 2011

Obrigada, chuva
Amaciou minha terra
Trazendo de volta a esperança
que há tempos a estiagem secou.

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Todos os amanhãs possíveis

Você é tão pequena, mas já é uma pessoinha. É incrível. Tem trejeitos, espreguiça no berço resmungando de sono. Fica feliz quando faço o que você quer, reclama se não. Até força o choro para fazer um drama. Deu para ficar de pé, tentando se segurar a tudo, ainda que meio rebolando para se equilibrar naquelas pernas coxudinhas, que eu quero morder e mordo todos os dias, sempre que posso. Você tem uma mania de dar um tapinha nas minhas costas quando te pego no colo que é muito bonito, porque eu tenho certeza que você está fazendo carinho. Como quando você arranca meus cabelos ou quase leva um pedaço da minha boca quando sou agarrada pelas suas mãozinhas, pequenas e pesadas para um ser de apenas um punhado de meses de vida. Depois de descobrir as mãos, descobriu o dedo indicador e adora levá-lo às pequenas coisas, bem miúdas mesmo, dignas de ser apontadas por você. A primeira vez que vi, você estava sentindo a textura de uma formiga morta. Vi antes de você comê-la. Sei que não terei essa sorte todas as vezes que essa curiosidade que pulsa, dentro do seu corpinho de coração rápido feito beija-flor, sair pelos seus olhos de jabuticabas. Até os cílios compridos parecem ter sido feitos para você enxergar muito mais as coisas que fazem você comemorar com as pernas. Cheias de dobrinhas. Nem tem dentes mas já mastiga pão, biscoito, pedaços no meio da papinha e faz cara de orgulhosa por tamanha independência. Morde meu queixo com sua banguela e manda beijos, estalos, soprinhos, cuspidas, larilarilari, nenenenen, mamamã. Posso te levar em qualquer lugar que ficamos bem, eu e você, companheiras que já somos. Sua simpatia conquista todo mundo que chega e que passa e aí eu que fico orgulhosa. Não existe tempo ruim com você. Acordar e ver sua carinha é a dose de leveza diária na minha vida, que chega a ser terapêutica. Adora quando eu mexo na sua orelha, chega a virar olho e recentemente descobri que derrete quando passo os dedos em você bem de levinho, o que eu também adoro! Você não gosta de ficar no colo porque gosta de explorar as coisas e ter os braços livres para bater palminhas, sacudir-se, tentar pegar o que não pode e colocar na boca. Exceto quando está fazendo charme, ou querendo um chamego - e lá vem os tapinhas. Mas de tão bom que é ser sua mãe, hoje quebrei a rotina e te ninei até você adormecer profundamente no meu colo. Dei beijinhos, fiz carinhos, senti o seu cheiro de filhotinho de beija-flor com jabuticaba com porquinho com pacotinha. E depois de te abraçar com todo o amor que em mim transborda e colocá-la no berço, estou aqui escrevendo feito uma mãe coruja, saboreando essas pequenas e doces lembranças para o meu sono também chegar. Que venham muitos amanhãs, pessoinha linda.

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Ciúme de você

As bochechas um pouco caídas, tal como um bulldog francês, e o olhar parado, denunciam a sua, rara, condição de seriedade. E a boca, desenhada a 0.5, com aquele detalhe no meio, fica um pouco aberta, o que faz, de vez em sempre, escorrer uma babinha. O interessante é que em vez de causar nojo, só o que faz é, automaticamente, gerar um ato de cuidado, de pegar um dos tantos paninhos que fazem parte dos apetrechos e limpar.
Uma careta, uma gracinha, esboça um sorriso e volta a ficar com a expressão séria. Será que é sono? Pode ser fome. Não, mamou há apenas duas horas. Está limpinha, então o que pode ser? Nada não. Só porque parece uma mala velha, sorrindo praticamente todos os segundos desde que acorda até dormir – e até dormindo, também sorri – não significa que as bochechas caídas são motivo de preocupação.
Até que, de repente, no meio daquela gente toda da festa junina da escolinha, ele chega. Entoa o seu grave chamamento e dois olhinhos jabuticábicos de cílios de boneca brilham. A bochecha é suspensa por um sorrisão banguelo, as pernas balançam e toda aquela seriedade, incomum, desaparece.
É... As meninas gostam mesmo dos seus papaizinhos.

sexta-feira, 27 de maio de 2011

Quase sem palavras

E lá estava parada com a mãozinha esticada, apontando para o alto, em frente a arvore. Não falava a boca e sim os olhos que miravam fixamente o pé de araçá. Perguntei o que queria. Insistiu em apontar pro alto. Dei a volta na sacada, fui até ela e me agachei para olhar também, tentando, em vão, me nivelar a ela para decifrar o mistério. Era um cacho cheio de frutos. Eu disse, Ah, a frutinha, mas está muito alto, querida... Imediatamente respondeu, Vovô!

Claro. Como eu podia ser boba assim. Quase sem palavras disse o que queria e a solução que precisava. Sábia, Olivia. Não tem nem dois anos e já economiza mal entendidos...

quarta-feira, 25 de maio de 2011

O meu caos

Esquento o leite para aquecer o corpo. Olho ao redor, uma bagunça. Coisas de neném com coisas de moto, contas com controles-remotos, chaves com resto de cebola cortada, roupas no chão com toalha molhada, sapato virado com cama desarrumada, remédio aberto, carrinho no meio do caminho, torneira pingando, moringa vazia, detergente acabando, fim do mês chegando, o sono me abraçando. Deito agora com a certeza de que sou muito feliz.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Muitos anos de vida







Quanto mais velho, mais bonito.
Contudo, para isso,
mesmo que vez ou outra
sejam necessárias podas e torções,
sua vida deve se resumir
a muitos cuidados e amor.


Imagem: Bonsai de Pitangueira -16 anos.



quinta-feira, 28 de abril de 2011

Primeira exposição



Entre aquarelas, poesias, filosofia
olhos, jabuticabas, estatelados sorriam
para cores e signos,
enquanto meus braços num abraço
onde não cabe tamanho amor


quarta-feira, 27 de abril de 2011

A descoberta

Meados de abril e eu com aqueles conhecidos sintomas pré-mestruais. Os seios inchados e doloridos, certa impaciência e um calendário que apontava para a solução disso; assim que ela descer, viro gente de novo, pensava. Estava no Rio de Janeiro, tinha acabado de alugar um apartamento no ponto mais nobre de Ipanema – na Rua Nascimento Silva, entre Joana Angélica e Maria Quitéria. A tão sonhada mudança para a cidade maravilhosa, a carreira internacional, as viagens, as milhas, os cartões fidelidade, o networking, a vida perto do mar, o glamour de uma capital culturalmente mais efervescente do que a provinciana Beagá, tudo o que eu achava que era importante na minha vida, de repente, foi colocado à prova.


Na semana da descoberta, antes mesmo de me mudar para o apartamento, fui fazer uma coisa rara – visto que eu estava morando num aparthotel –, algo para comer, e ao quebrar o ovo tive a surpresa de encontrar duas gemas. Achei engraçado e na solidão de uma quase-mudança de cidade, compartilhei com meus amigos no facebook o acontecido. Dentre todos os tipos de respostas, uma assim: pode ser um sinal…


Sinal de quê?


Coincidências à parte, acordei no meio da madrugada seguinte com a mão na barriga. Para livrar-me de uma ansiedade desnecessária, comprei logo um teste de farmácia e fiz no primeiro xixi da manhã. Era só para chegar em Beagá no dia seguinte tranquila, caso me perguntassem eu diria, tá tudo certo, fiz o teste ontem. Já havia feito desse teste antes, mas nunca recebi o produto das mãos de uma atendente que sorrisse tanto para mim. Muito esquisito.


Duas listras quer dizer grávida, uma listra quer dizer não grávida, mas aqui tem duas listras, duas listras quer dizer grávida, uma listra não grávida, mas aqui tem duas, não tem uma só, devia ter, mas não tem! Coloquei o teste lado a lado com as instruções e estava lá, meu teste, igualzinho o positivo da bula. Eu tremia, chorava, ria, sentia medo, negação, olhava a barriga no espelho, tudo ao mesmo tempo. Já sofria só de pensar em como daria a notícia, no que eu faria se fosse sozinha, no que eu faria se fosse junto, no que eu não faria, enquanto, descabelada, dentro de um táxi, ia para um laboratório fazer um exame de sangue. Mais uma pessoa que me atendeu demasiadamente sorridente e o sorriso se alargou ainda mais quando contei o ocorrido. Para me "tranquilizar” disse, minha filha, se deu positivo o de farmácia, você está mais que grávida, seus hormônios já estão lá nas alturas!


E a essa altura, mal sabia eu que um danado de um flagelinho sapeca era o ator principal da maior descoberta da minha vida até então: que eu não fazia a menor idéia do que é importante na vida. E o mais incrível, a noção nem chega assim…vem vindo em doses homeopáticas a cada mudança desencadeada pela fusão de amor que me salvou e que vai salvar esse mundão doente que a gente deixou de herança para os nossos pequeninos e pequeNinas.



quinta-feira, 7 de abril de 2011

Novo parto




É tanta coisa acontecendo ao mesmo tempo, tanta coisa circulando em tantos canais virtuais e presenciais - cada vez mais virtuais, fato - que, por várias vezes, quis parar para escrever, mas desisti. Coisas bacanas sobre a minha gestação, da emoção do parto já com as primeiras quebras de conceitos e, depois, sobre a existência de um serzinho, que nasceu tão cheio de possibilidades e que vai se revelando, dia-a-dia.


Aí dá vontade escrever sempre. Quando vejo uma carinha diferente, quando vejo os primeiros tudo, o sorriso, aquele olhar, quando ela passa a reconhecer os mais próximos, a cara quando o pai chega do trabalhor barbarizando, quando começa a se comunicar, a balbuciar, formar as primeiras silabas, se divertir comigo, com aquilo, consigo mesmo. Tudo o que acontece dá vontade de contar.


Dá vontade de escrever sobre a explosão de amor e do pânico da finitude que, de repente, invadiu minha alma e tomou conta de todas as noites e todos os sonhos, porque o sono, já era. Clichê, verdade. Sono alerta e sonhos trazem à tona os medos que me cercam o dia inteiro pelo peso - tão leve! - da responsabilidade de cuidar desse serzinho, sorridentemente banguelo e desarmador, desacelerador, desmascarador. De tanta vontade de escrever sobre tanta coisa, foi ficando cada vez mais difícil e a sobrecarga de informações por aí me faz pensar, para quê? Tanta gente já escreveu sobre isso. Tanta gente escreve. É tanta coisa. Tanto item.


Mentira. É que a intensidade dos acontecimentos e a felicidade de ter a oportunidade de viver cada dia dessa vida singular com a pessoinha que está dormindo no quarto ao lado - uma coisa linda, no bercinho, luz apagada, até amanhã de manhã - e que, mesmo chorando de fome, abre um sorriso enorme - e ainda banguelo! - quando colocamos nossa cara na frente dela, claro, para depois voltar a chorar, tem sido muito maior que qualquer vontade de me expressar, ou me relacionar com o mundo, seja como for.


Para parar e escrever era preciso entender como estou agora que as coisas estão bem diferentes dentro de mim, como rever se importa para mim se vou conseguir um texto legal ou mais ou menos, se meu cabelo está bonito grande ou fica melhor curto, se minha pele melhorou ou se está demorando muito, se prefiro ser executiva de multinacional ou dona de casa, se sou mais ou menos bonita que x ou y, se tenho 300 amigos no facebook ou dois que fazem tudo por mim na minha vida real, se estou muito magra ou se devo ir correndo para academia, para depois postar minha foto de frente pro espelho e de costas para a única verdade que existe. No fim das contas, o destino de todo mundo é o mesmo; o fim.


E até hoje não tinha me dado vontade de escrever, até eu ter vontade de escrever o que já foi escrito muitas vezes. O tempo é curto, voa, a vida e uma só, e a gente pode escolher viver de aparências, de se gabar de ter coisas bonitas e caras, de conhecer lugares exóticos, de viver usando máscaras, se achando mais bonito ou mais legal ou mais descolado que o outro, ou pode escolher outra coisa. Tipo dizer sim, primeiro. E ser gentil, primeiro. Fazer companhia ao outro, dar o lugar, passar a vez, chegar em segundo, o que que tem? Pedir desculpas, pedir a mão, estender a mão, abrir mão. Mudar de idéia, pensar bem, voltar atrás. Relevar e perdoar. E escrever para os que vão ficar mais um tempo depois da gente, menos sobre a gente e mais sobre coisas alegres. Mesmo que sejam escritas porque estamos tristes naquele dia. Geralmente é assim, porque a felicidade é tão sublime e o tempo a engole tão rapidamente, que é melhor não perder tempo escrevendo. Melhor é degustá-la, feito comidinha de mãe... É isso. Não escrevi até então, porque hoje sou mãe.