segunda-feira, 22 de abril de 2013

Suave queda




Da minha janela vejo
duas pipas se saracoteando

De repente, uma abateu a outra
que foi caindo lentamente

Cena tão triste...

Nem as pipas vivem em paz
mesmo sendo imenso o céu





segunda-feira, 8 de abril de 2013

Espanto




     
                  Sobra encanto
                          pra todo encontro.



sexta-feira, 5 de abril de 2013

Enluarar




De uma pequena brecha na janela
a lua exibida se lançou na minha noite 
me fazendo levantar.

Se fosse cheia, num sei não, 

era capaz de em disparada
eu ir daqui até além mar.


domingo, 23 de outubro de 2011

Obrigada, chuva
Amaciou minha terra
Trazendo de volta a esperança
que há tempos a estiagem secou.

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Todos os amanhãs possíveis

Você é tão pequena, mas já é uma pessoinha. É incrível. Tem trejeitos, espreguiça no berço resmungando de sono. Fica feliz quando faço o que você quer, reclama se não. Até força o choro para fazer um drama. Deu para ficar de pé, tentando se segurar a tudo, ainda que meio rebolando para se equilibrar naquelas pernas coxudinhas, que eu quero morder e mordo todos os dias, sempre que posso. Você tem uma mania de dar um tapinha nas minhas costas quando te pego no colo que é muito bonito, porque eu tenho certeza que você está fazendo carinho. Como quando você arranca meus cabelos ou quase leva um pedaço da minha boca quando sou agarrada pelas suas mãozinhas, pequenas e pesadas para um ser de apenas um punhado de meses de vida. Depois de descobrir as mãos, descobriu o dedo indicador e adora levá-lo às pequenas coisas, bem miúdas mesmo, dignas de ser apontadas por você. A primeira vez que vi, você estava sentindo a textura de uma formiga morta. Vi antes de você comê-la. Sei que não terei essa sorte todas as vezes que essa curiosidade que pulsa, dentro do seu corpinho de coração rápido feito beija-flor, sair pelos seus olhos de jabuticabas. Até os cílios compridos parecem ter sido feitos para você enxergar muito mais as coisas que fazem você comemorar com as pernas. Cheias de dobrinhas. Nem tem dentes mas já mastiga pão, biscoito, pedaços no meio da papinha e faz cara de orgulhosa por tamanha independência. Morde meu queixo com sua banguela e manda beijos, estalos, soprinhos, cuspidas, larilarilari, nenenenen, mamamã. Posso te levar em qualquer lugar que ficamos bem, eu e você, companheiras que já somos. Sua simpatia conquista todo mundo que chega e que passa e aí eu que fico orgulhosa. Não existe tempo ruim com você. Acordar e ver sua carinha é a dose de leveza diária na minha vida, que chega a ser terapêutica. Adora quando eu mexo na sua orelha, chega a virar olho e recentemente descobri que derrete quando passo os dedos em você bem de levinho, o que eu também adoro! Você não gosta de ficar no colo porque gosta de explorar as coisas e ter os braços livres para bater palminhas, sacudir-se, tentar pegar o que não pode e colocar na boca. Exceto quando está fazendo charme, ou querendo um chamego - e lá vem os tapinhas. Mas de tão bom que é ser sua mãe, hoje quebrei a rotina e te ninei até você adormecer profundamente no meu colo. Dei beijinhos, fiz carinhos, senti o seu cheiro de filhotinho de beija-flor com jabuticaba com porquinho com pacotinha. E depois de te abraçar com todo o amor que em mim transborda e colocá-la no berço, estou aqui escrevendo feito uma mãe coruja, saboreando essas pequenas e doces lembranças para o meu sono também chegar. Que venham muitos amanhãs, pessoinha linda.

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Ciúme de você

As bochechas um pouco caídas, tal como um bulldog francês, e o olhar parado, denunciam a sua, rara, condição de seriedade. E a boca, desenhada a 0.5, com aquele detalhe no meio, fica um pouco aberta, o que faz, de vez em sempre, escorrer uma babinha. O interessante é que em vez de causar nojo, só o que faz é, automaticamente, gerar um ato de cuidado, de pegar um dos tantos paninhos que fazem parte dos apetrechos e limpar.
Uma careta, uma gracinha, esboça um sorriso e volta a ficar com a expressão séria. Será que é sono? Pode ser fome. Não, mamou há apenas duas horas. Está limpinha, então o que pode ser? Nada não. Só porque parece uma mala velha, sorrindo praticamente todos os segundos desde que acorda até dormir – e até dormindo, também sorri – não significa que as bochechas caídas são motivo de preocupação.
Até que, de repente, no meio daquela gente toda da festa junina da escolinha, ele chega. Entoa o seu grave chamamento e dois olhinhos jabuticábicos de cílios de boneca brilham. A bochecha é suspensa por um sorrisão banguelo, as pernas balançam e toda aquela seriedade, incomum, desaparece.
É... As meninas gostam mesmo dos seus papaizinhos.

sexta-feira, 27 de maio de 2011

Quase sem palavras

E lá estava parada com a mãozinha esticada, apontando para o alto, em frente a arvore. Não falava a boca e sim os olhos que miravam fixamente o pé de araçá. Perguntei o que queria. Insistiu em apontar pro alto. Dei a volta na sacada, fui até ela e me agachei para olhar também, tentando, em vão, me nivelar a ela para decifrar o mistério. Era um cacho cheio de frutos. Eu disse, Ah, a frutinha, mas está muito alto, querida... Imediatamente respondeu, Vovô!

Claro. Como eu podia ser boba assim. Quase sem palavras disse o que queria e a solução que precisava. Sábia, Olivia. Não tem nem dois anos e já economiza mal entendidos...

quarta-feira, 25 de maio de 2011

O meu caos

Esquento o leite para aquecer o corpo. Olho ao redor, uma bagunça. Coisas de neném com coisas de moto, contas com controles-remotos, chaves com resto de cebola cortada, roupas no chão com toalha molhada, sapato virado com cama desarrumada, remédio aberto, carrinho no meio do caminho, torneira pingando, moringa vazia, detergente acabando, fim do mês chegando, o sono me abraçando. Deito agora com a certeza de que sou muito feliz.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Muitos anos de vida







Quanto mais velho, mais bonito.
Contudo, para isso,
mesmo que vez ou outra
sejam necessárias podas e torções,
sua vida deve se resumir
a muitos cuidados e amor.


Imagem: Bonsai de Pitangueira -16 anos.



quinta-feira, 28 de abril de 2011

Primeira exposição



Entre aquarelas, poesias, filosofia
olhos, jabuticabas, estatelados sorriam
para cores e signos,
enquanto meus braços num abraço
onde não cabe tamanho amor


quarta-feira, 27 de abril de 2011

A descoberta

Meados de abril e eu com aqueles conhecidos sintomas pré-mestruais. Os seios inchados e doloridos, certa impaciência e um calendário que apontava para a solução disso; assim que ela descer, viro gente de novo, pensava. Estava no Rio de Janeiro, tinha acabado de alugar um apartamento no ponto mais nobre de Ipanema – na Rua Nascimento Silva, entre Joana Angélica e Maria Quitéria. A tão sonhada mudança para a cidade maravilhosa, a carreira internacional, as viagens, as milhas, os cartões fidelidade, o networking, a vida perto do mar, o glamour de uma capital culturalmente mais efervescente do que a provinciana Beagá, tudo o que eu achava que era importante na minha vida, de repente, foi colocado à prova.


Na semana da descoberta, antes mesmo de me mudar para o apartamento, fui fazer uma coisa rara – visto que eu estava morando num aparthotel –, algo para comer, e ao quebrar o ovo tive a surpresa de encontrar duas gemas. Achei engraçado e na solidão de uma quase-mudança de cidade, compartilhei com meus amigos no facebook o acontecido. Dentre todos os tipos de respostas, uma assim: pode ser um sinal…


Sinal de quê?


Coincidências à parte, acordei no meio da madrugada seguinte com a mão na barriga. Para livrar-me de uma ansiedade desnecessária, comprei logo um teste de farmácia e fiz no primeiro xixi da manhã. Era só para chegar em Beagá no dia seguinte tranquila, caso me perguntassem eu diria, tá tudo certo, fiz o teste ontem. Já havia feito desse teste antes, mas nunca recebi o produto das mãos de uma atendente que sorrisse tanto para mim. Muito esquisito.


Duas listras quer dizer grávida, uma listra quer dizer não grávida, mas aqui tem duas listras, duas listras quer dizer grávida, uma listra não grávida, mas aqui tem duas, não tem uma só, devia ter, mas não tem! Coloquei o teste lado a lado com as instruções e estava lá, meu teste, igualzinho o positivo da bula. Eu tremia, chorava, ria, sentia medo, negação, olhava a barriga no espelho, tudo ao mesmo tempo. Já sofria só de pensar em como daria a notícia, no que eu faria se fosse sozinha, no que eu faria se fosse junto, no que eu não faria, enquanto, descabelada, dentro de um táxi, ia para um laboratório fazer um exame de sangue. Mais uma pessoa que me atendeu demasiadamente sorridente e o sorriso se alargou ainda mais quando contei o ocorrido. Para me "tranquilizar” disse, minha filha, se deu positivo o de farmácia, você está mais que grávida, seus hormônios já estão lá nas alturas!


E a essa altura, mal sabia eu que um danado de um flagelinho sapeca era o ator principal da maior descoberta da minha vida até então: que eu não fazia a menor idéia do que é importante na vida. E o mais incrível, a noção nem chega assim…vem vindo em doses homeopáticas a cada mudança desencadeada pela fusão de amor que me salvou e que vai salvar esse mundão doente que a gente deixou de herança para os nossos pequeninos e pequeNinas.



quinta-feira, 7 de abril de 2011

Novo parto




É tanta coisa acontecendo ao mesmo tempo, tanta coisa circulando em tantos canais virtuais e presenciais - cada vez mais virtuais, fato - que, por várias vezes, quis parar para escrever, mas desisti. Coisas bacanas sobre a minha gestação, da emoção do parto já com as primeiras quebras de conceitos e, depois, sobre a existência de um serzinho, que nasceu tão cheio de possibilidades e que vai se revelando, dia-a-dia.


Aí dá vontade escrever sempre. Quando vejo uma carinha diferente, quando vejo os primeiros tudo, o sorriso, aquele olhar, quando ela passa a reconhecer os mais próximos, a cara quando o pai chega do trabalhor barbarizando, quando começa a se comunicar, a balbuciar, formar as primeiras silabas, se divertir comigo, com aquilo, consigo mesmo. Tudo o que acontece dá vontade de contar.


Dá vontade de escrever sobre a explosão de amor e do pânico da finitude que, de repente, invadiu minha alma e tomou conta de todas as noites e todos os sonhos, porque o sono, já era. Clichê, verdade. Sono alerta e sonhos trazem à tona os medos que me cercam o dia inteiro pelo peso - tão leve! - da responsabilidade de cuidar desse serzinho, sorridentemente banguelo e desarmador, desacelerador, desmascarador. De tanta vontade de escrever sobre tanta coisa, foi ficando cada vez mais difícil e a sobrecarga de informações por aí me faz pensar, para quê? Tanta gente já escreveu sobre isso. Tanta gente escreve. É tanta coisa. Tanto item.


Mentira. É que a intensidade dos acontecimentos e a felicidade de ter a oportunidade de viver cada dia dessa vida singular com a pessoinha que está dormindo no quarto ao lado - uma coisa linda, no bercinho, luz apagada, até amanhã de manhã - e que, mesmo chorando de fome, abre um sorriso enorme - e ainda banguelo! - quando colocamos nossa cara na frente dela, claro, para depois voltar a chorar, tem sido muito maior que qualquer vontade de me expressar, ou me relacionar com o mundo, seja como for.


Para parar e escrever era preciso entender como estou agora que as coisas estão bem diferentes dentro de mim, como rever se importa para mim se vou conseguir um texto legal ou mais ou menos, se meu cabelo está bonito grande ou fica melhor curto, se minha pele melhorou ou se está demorando muito, se prefiro ser executiva de multinacional ou dona de casa, se sou mais ou menos bonita que x ou y, se tenho 300 amigos no facebook ou dois que fazem tudo por mim na minha vida real, se estou muito magra ou se devo ir correndo para academia, para depois postar minha foto de frente pro espelho e de costas para a única verdade que existe. No fim das contas, o destino de todo mundo é o mesmo; o fim.


E até hoje não tinha me dado vontade de escrever, até eu ter vontade de escrever o que já foi escrito muitas vezes. O tempo é curto, voa, a vida e uma só, e a gente pode escolher viver de aparências, de se gabar de ter coisas bonitas e caras, de conhecer lugares exóticos, de viver usando máscaras, se achando mais bonito ou mais legal ou mais descolado que o outro, ou pode escolher outra coisa. Tipo dizer sim, primeiro. E ser gentil, primeiro. Fazer companhia ao outro, dar o lugar, passar a vez, chegar em segundo, o que que tem? Pedir desculpas, pedir a mão, estender a mão, abrir mão. Mudar de idéia, pensar bem, voltar atrás. Relevar e perdoar. E escrever para os que vão ficar mais um tempo depois da gente, menos sobre a gente e mais sobre coisas alegres. Mesmo que sejam escritas porque estamos tristes naquele dia. Geralmente é assim, porque a felicidade é tão sublime e o tempo a engole tão rapidamente, que é melhor não perder tempo escrevendo. Melhor é degustá-la, feito comidinha de mãe... É isso. Não escrevi até então, porque hoje sou mãe.







terça-feira, 21 de dezembro de 2010

A Nina vai nascer



Aproxima-se o Natal. Foram poucas as oportunidades em que me imbuí desse clima espiritual que contamina quase todos os povos, especialmente aos Cristãos.


Afirmam alguns ser tempo de mudanças e de transformação. Tempo de renovação das esperanças, tempo de se doar, tempo de perdoar, tempo de confraternizar...


Que seja tudo isso, pois, afinal, são as aspirações de toda a humanidade!


Neste Natal, porém, aqueles sentimentos tão distantes de minhas recordações, parecem que se afloram novamente. O coração bate esperançoso e a mente pressente transformações, as mais auspiciosas, para um futuro recente. O sentimento de solidariedade se avoluma, transformo-o em realidade, sinto me feliz por isso. Já não tenho a quem perdoar, pois também esqueci todas as mágoas do passado.


A renovação da vida, enfim, torna-se realidade e agradeço.


Se tudo isso já não bastasse, tem o presente que vou receber, que belo presente! Trata-se da Nina, a filha da Flavinha que está para nascer.Ela traz em sua preciosa bagagem a harmonia da união entre seus próprios pais – e como dá gosto ver isso -, de sua legítima avó, Miriam, com o Vagner – avô emprestado – e de todos os entes queridos dessa família.


Parabéns e obrigado, Nina. Você é símbolo dessa maravilhosa transformação! Você é a nova luz, com matizes dos mais variados, que iluminará nossas vidas – de todos -, de hoje em diante!

Um beijo pra você, sua mãe e um forte abraço para seu pai, Bruno.


Gnerva Tulivar – 21 de dezembro de 2010.



Obs: presente que a mamãe ganhou de natal do seu vovô, pequeNina. Nada emprestado, muito amado, você vai ver...


Imagem: foto de Vartuli



sexta-feira, 23 de julho de 2010

Trezentos gramas e vinte centímetros de perfeição



Eu com a minha mania de querer ser menino, gostar das brincadeiras de menino, querer ficar perto de menino, acabei ganhando de presente uma menina.

Minha menina...

Ai que medo me aflige!

Não tenho muito o que dizer, assim bonito, assim poético, etc e tal. As vezes meus escritos nem são tão bons mesmo... Agora, mais do que nunca, nao estou nem aí para isso. Até porque acho que estou muito longe de conseguir chegar perto de qualquer palavra, frase ou oraçao que expresse uma pontinha do que foi e é saber que é ela...

Que angústia da repetição!

Que oportunidade de amar um amor tao infinito que possa curar a boneca-mãe dos seus medos bobos!

Minha filhinha, minha menina... seus chutinhos me ajudam a ter mais coragem para a missao de ser sua mãe e espero que sinta orgulho desse meu oficio, porque agora eu sei que tinha que ser você mesmo.

E explodo em lágrimas de alegria de saber que você esta vindo, minha pequeNina.


segunda-feira, 24 de maio de 2010

Vaso quebrado



Uma vez eu estava num bar, na companhia de dois músicos geniais, sessentões. Eles conversavam com um olhar de admiração mútua. De repente, constataram e concordaram entre si: “A vida é um sonho, quando a gente abre os olhos, ela já passou”. Nunca me esqueço dessa cena e dessas palavras. Naquele momento, era uma nostalgia que me parecia distante. Eu, diante deles, com mais metade da idade, não tinha me dado conta da verdade que ali se apresentou delicadamente.

Algum tempo depois, não muito, tantos foram os acontecimentos. Mudanças de casa, no trabalho. Novas amizades. Chegando filhos de amigos, velhos companheiros indo embora. Alguns casamentos, alguns rompimentos. Lágrimas de tristeza e de alegria. A vida seguindo o seu ciclo de altos e baixos. Esse ritmo sempre guiado pela minha essência; uma pessoa extremamente apaixonada. Intensa. Talvez por isso tantas lágrimas, tantas mudanças. Uma dose a mais de drama aqui, uma euforia exagerada ali.

A vida corre mesmo. A minha então… A essência fica, mas o vento que bate na cara, nas descidas bruscas dos baixos passa transformando. Algumas coisas mudam. Eu queria dizer que somos lapidados. Mas isso remete a um pedaço bruto que vai se tornando uma obra prima maravilhosa. Nem sempre é assim. Às vezes, coisas bonitas são perdidas. Como aquele vestido lindo que comprei e que ficou deslumbrante, mas que não foi usado no dia e, agora, já não serve mais. Pode até ser que sirva de novo um dia. Mas não vai mais causar aquela sensação de parecer ter sido feito para mim, para aquele dia. A gente vai mudando sim. E o que um dia não parecia ter grandes efeitos, de repente fica. O que machucava e sarava já não sara do mesmo jeito. Sabe quando a gente tira casquinha do machucado pra ficar livre da marca rápido, mas só o que faz é sangrar de novo e aumentar a marquinha? Feito um vaso quando quebra e a gente tenta colar. Pode até ficar inteiro. Mas sempre vai ser um vaso quebrado.

O tempo implacável, nessa roda viva e gigante, deixa de herança lembranças. Às boas, cabe o alento nas horas mais difíceis, quando as ruins insistem em criar uma carapaça em cima daquela chama do eu, essencialmente apaixonado e entregue. E quando o vestido não servir mais, ou quando aparecerem as linhas dos cacos colados? Cabe também às boas lembranças ajudar a mostrar que isso serve apenas para que haja menos tristeza em qualquer próximo acontecimento. Dos tantos que ainda serão. Até que, numa mesa de bar com um bom amigo como companhia, eu possa com muita saudade abrir os olhos, e constatar que a vida é mesmo um sonho.

Um belo de um sonho.

terça-feira, 4 de maio de 2010

Todo-coração



Hoje me deu vontade de ver um dia lindo
De ver o dia
Tenho estado submersa num lugar onde a única luz está escondida dentro de mim
Um pequeno e crescente ser
Uma criaturinha com um coração que já bate acelerado
Pude ver e ouvir
Uma pulsação ansiosa para bombear sangue e vida
Ainda não sinto esse pequenino ser
Exceto por alguns caprichos do estômago
E dor na mais feminina parte do corpo que desponta para prover alimento
Mas o todo-coração serzinho, milimétrico meu fruto de puro amor, é grandioso
Pois é razão da minha vontade de emergir e respirar
Para todos os dias lindos que quero ver
Até a beleza dos dias só não ser maior do que a do rostinho do meu - já eterno - amor





segunda-feira, 26 de abril de 2010

Oração




Curvo diante a força
e dobro diante a luz

Oh, força poderosa
do universo, afastai de mim
os pés que perseguem
as palavras que ferem
os olhares que aniquilam
e os desejos que nos
maltratam de longe.

Oh, todo poderoso,
abre para seu humilde filho
a cena do bem e estrada do amor
com a vossa força e a vossa luz

Que assim seja.

Amém.


Oração da Umbanda, enviada pra mim pelo amigo querido Fel... Conforto e amor.



terça-feira, 20 de abril de 2010

Ironia do destino




Apenas um milímetro.
Se não tinha amor bastante, não importa.
Já não estou mais sozinha.




segunda-feira, 15 de março de 2010

Quem sabe?







"Quem poderá fazer

Aquele amor morrer

Se o amor é como um grão!

Morrenasce, trigo

Vivemorre, pão"

Gil


De tão leve e singelo, tudo vira grão.

É um gesto. Um pousar de mãos em qualquer parte do corpo que esteja perto. Ou os pés para garantir a presença que o sono as vezes leva para longe. É um olhar. Um para cada tipo de reconhecimento. O de saber ter agradado. O de saber ter chateado. O de saber gostar daquela música. O de não saber o que há. O de saber-se aprendiz do outro e de si mesmo. É um menu que surpreende cada vez menos. Cada dia menos necessário, para gostos cada vez mais conhecidos. É um carrinho de compras que muda de aparência. Sendo também integral, acumulando rosé's. É um pronome inventado. Para uso pessoal. Para não ser igual. Para ser único em vez de dois. Para ser singular. É uma paciência a mais. Para transformar a ausência de respostas em cumplicidade no silêncio. É não ter medo do silêncio. Então devagarinho e calmo, um sopro suave espalha e mistura tudo, semeando grão a grão. Talvez faça nascer, crescer, ou até mesmo desabrochar um grande amor.

Talvez...

imagem: autor desconhecido


quinta-feira, 4 de março de 2010

Pinot noir e lírios





Um psiquiatra australiano disse essa semana que sua pesquisa comprovou que pessoas felizes são egoístas. Que a tristeza faz com que as pessoas percebam mais o mundo exterior, logo as outras pessoas. Que os tristes ajudam mais. Fiquei pensando nisso, mas acho que eu não estava num bom dia. Porque achei que o ser humano é sempre tão egoísta, que se ele ajuda mais porque está triste é para se sentir um pouco melhor, com o fato de ver que sempre tem alguém pior. E resolvi que nada melhor do que a gente se ajudar primeiro. Dar uma mãozinha, sabe? O dia estava realmente difícil. São tantas mudanças e um território que não me pertence. E ainda tem os outros. Sim, existem outros e seus conflitos. Os altos. Os baixos. O desânimo deu uma invadida que a cama tem chamado cedo. Nove e meia, dez da noite. Pra acordar cansada. Já conheço esse filme. O elenco? Só uma pessoa atuando. Passeei pelas ruas, não vi ninguém. Como se tudo estivesse congelado, menos eu. Almocei sozinha. Comprei flores para mim. Passei num “café” charmoso. Adoro o aroma. Parei na loja de sempre, o sommelier reparou que eu estava diferente dos outros dias. Comentou. Não respondi. Cheguei em casa e coloquei as flores num vaso com água. Num gesto de carinho aos meus sentidos, dei aos meus ouvidos Jobim. Ao meu olfato o perfume dos lírios. A meu paladar a companhia do pinot noir. E ao meu coração a calma de saber tudo acaba no seu devido lugar. Desde que não falte água às flores.



Imagem: e urubu de Jobim...




sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Mas passa





De repente o cinza descolore o céu.
Descolore o mar
e apaga o riso e sorriso.

De repente a chuva cai fria.
Cai mansa
e as gotas caem no choro.

De repente é amor demais.
Inteiro demais
e vira apenas mais um soluço.


quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Causa mortis







Passados alguns dias
o laudo revela:

ele morreu de beijo.



Imagem: A Um Passo da Eternidade, 1953, cena de amor entre Deborah Kerr e Burt Lancaster



terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Mineira na praia - mas não em férias - 2






Parece um pouco surreal. Ainda mais com aquela lua cheia que estava nascendo no mar. Tirei uma foto de dentro do táxi – o que me fez atrasar mais e por pouco não perdi o vôo.

Uma pequena quantidade de roupa. O suficiente para um fim de semana. Em BH. Que BH que nada. Em um casulo. Casulo de noite e de dia. Precisa mais nada não. O resto é o vento e o sol batendo no rosto quando raro desencasula. Mesmo assim, bem perto.

Descobri que duas rodas é bem melhor. Só não é mais que chão. Se bem que eu acho que vale todos os estratos, veículos e espaço. No chão, sobre rodas, no ar. Na cama, na rede, na sala de estar. O importante mesmo é estar lá, sideral...

Divaga, vaga, para e volta. O telefone que toca traz à tona o presente. Já me derreti de calor. Já andei apressada por causa do horário. Já tomei um cano de um carioca
exxxperto. Já tomei uma cerveja antes do almoço. Já comprei mais alguns CD’s dos Beatles para a coleção. Já encontrei a terapeuta que estou precisando; para ver se consigo guardar tudo isso dentro da cachola. E ainda tenho que lembrar de passar ali na praia para fazer a oferenda à Janaína. Porque, já que estou de volta, é melhor não descuidar.

Iemanjá, Odó Iyá. O dia é seu. O interesse em celebrar é todo meu, pra ver se a cor fica de casulo até borboleta.



imagem: aquela, de dentro do taxi

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Mineira na praia - mas não em férias - 1






Faz calor demais, mas o centro é muito lindo. Dia desses fui num happy hour na Rua do Ouvidor. Um beco com boteco. E cerveja original com tira-gosto. Até me senti em casa. Fui caminhando devagar e olhando para cima, vendo os prédios imponentes. Os modernos se misturam com os centenários e os palácios. Numa brecha apareceu um fio de sol e a silhueta das montanhas. Estou no Rio de Janeiro, saindo do trabalho.

O coração anda ocupado, mas o Carlos Drumond de Andrade já avisou que o amor quando pula o muro e sobe na árvore tem um destino daqueles. Enquanto finjo evitar esse destino, vou me ocupando com a praia há três quadras da minha casa e a caminhada diária até a estação do metrô. Vou trabalhar. Volto. Como um "japonês" por conta da empresa. Não está ruim não, né? E ainda por cima, estou dando sorte com os cariocas que têm fama de serem marrentos. Desde que cheguei tenho sido muito bem recebida em todos os lugares. Convite para teatro, cinema, um barzinho. Com nome na porta e direito a acompanhante. Vinho na casa de uma querida amiga. Camareiras que cuidam de mim como se eu fosse uma órfã. Arranjei um monte de mãe. A do bar da piscina que mesmo quando não quero leva alguma coisa para eu comer, além das bebidinhas para a minha geladeira. A supervisora da limpeza, de uma delicadeza ímpar, cuida da casa como se fosse dela e das minhas coisas com um preciosismo de dar gosto. A do café da manhã que mandou comprar manteiga só para mim. A da recepção que tem um belo de um sorrisão toda manhã. E os rapazes da segurança que abrem a porta e sorriem, consertam alguma coisa. Juro, se eu reclamar, podem me internar.

Ontem no metrô que vive superlotado, dei lugar a uma senhora. Ela ficou repetindo que não precisava, que seria apenas uma estação. Mentira, ela desceria em Botafogo, cerca de quatro estações à frente. Sentou-se e agradeceu com aquela carinha de vó – será que sou sentimental?. Logo apareceu outro lugar aonde me acomodei. Quando me esqueci da velinha e me concentrei na esperada chegada em casa, tomei um susto. Eu estava sentada perto da janela e a senhora ao descer, bateu no vidro e deu um sorriso lindo pra agradecer. Fiquei emocionada. Acho que sou mesmo sentimental...

Saudades?

Todas, mas tenho sido bem tratada por aqui. Que São Sebastião conserve. E que São Jorge me empreste suas roupas e armas para ser só feliz. Porque, já disseram, é melhor ser alegre que ser triste.

Amém.


domingo, 24 de janeiro de 2010

Verdade



Monossilábica ou
silenciosa.

Antes fosse
um grito, um surto
ou um soco.


sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Eurita 357





É assim. Um turbilhão. Não é possível que em nenhum momento da minha vida as coisas vão acontecer de forma mais serena, mais calma. Calma! Mal cheguei na casa de varanda pra serra. De rede vermelha de amar. Amar o amor e amar a vista. Que que tem se não é pro mar? Tem nada não. Tinha. O marido deitado nela fumando o cigarrinho, com cara de pensativo. Tinha o bonito, nos quarenta e sete do segundo tempo, que adora uma rede, pra eu aconchegar e ficar bem perto. E uma santa que fica vigiando tudo o que acontece ali. Quase não coube no espaço, mas ela quis caber e coube. E deve fechar os olhos às vezes pra não ver tamanha confusão de gente. Gente que entra, gente que sai. Gente que vai e vem. E fica. E tanta música esquisita. E música boa também. A santa deve ficar agoniada algumas vezes que sente que alguma tristeza paira no ar. Porque tristeza é uma coisa que não combina com aquele lugar. Vale até luzinhas de natal sem ser natal. Mesmo que todo mundo que entre fale, olhe, é natal. Que raiva. Nem entendem a instalação do marido. E ele nada de Guimarães Rosa. Até achou bonita a letra no azulejo, mas o Leminski agradou mais. Eu acho. Acho também que a cozinha é grande, ótima para cozinhar, mas só tem cerveja. E vinho. Vinho. E cerveja. A maior produção de latinhas das redondezas. Nunca vi. Dá até para abrir um negócio. Só os amigos sustentariam o empreendimento. Faltou cozinhar. O marido até fala que gosta de cozinhar. Eu também. Mas o negócio dele mesmo é o tal wii. E o meu, não sei. Sorte que o Bolão é do lado. Ui, às vezes o cheiro de bolonhesa causa até desespero. Faltou o cachorro também apesar da jabuticabeira e as outras meninas terem cumprido um papel importante. Claro que num bairro como aquele, plantas ajudam a compor o cenário. Ah, e o barbeiro velinho também. Pelo menos para o marido passar em frente e dizer que vai fazer a barba lá um dia. Um dia vai, mas antes é preciso ir ao Marilton’s, tomar uma...cerveja. Novidade. Além da vontade de variar o cardápio. Mudar de rochedão, pra caol. Mudança significativa. Pelo menos anda uns quarteirões pra queimar as calorias. Mentira. Vai de carro mesmo. Essa vida ainda vai nos matar... Mas não isso mesmo que nos faz viver? È marido...essa vida é bandida mesmo. Ela faz o que quer. Rouba da gente o que quer, devolve quando quer ou nem devolve. Dissolve. Agora a vista pro mar está até bonita. O cristo tem uns braços abertos assim, grandão, que é bom pra quem é carente assim, tipo eu. A música está em todo lugar e o medo dentro de mim. Estou enfrentando o medo mais uma vez. Sozinha. Mais uma vez sozinha, mas dessa vez acompanhada das melhores lembranças da casinha de varanda com rede vermelha com vista pra serra, um marido, um bonito, muitos amigos, uma santa, algumas plantas e muita saudade.


Imagem: um amanhecer na eurita 357

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Dia furta-cor





O céu claro que se anuncia
é apenas uma amostra
da felicidade pairando no ar.
E assim começo o meu dia,
Tudo colorido, tudo azul
tudo certo, tudo rosé
tudo aqui, tudo agora.
Nem escrever consigo,
nesse tempo que me resta.
Quero gozar dessa alegria,
dessa coisa que irradia,
que se transmuta riso,
em calma, em paz,
em respiro mais suave.
No tempo que me resta
não desejo mais nada
que não seja você
e sua adorável companhia.


Imagem: foto de um dia em Santa Tereza, azul rosa, furta-cor.

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Interlúdio



As palavras estão muito ditas
e o mundo muito pensado.
Fico ao teu lado.

Não me digas que há futuro
nem passado.
Deixa o presente — claro muro
sem coisas escritas.

Deixa o presente. Não fales,
Não me expliques o presente,
pois é tudo demasiado.

Em águas de eternamente,
o cometa dos meus males
afunda, desarvorado.

Fico ao teu lado.

Cecília Meireles

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Quer vinho, vem



Um amigo meu adora a frase "Só o vinho é real".
Eu sempre achei graça.
Hoje entendi.
Tem verdades que duram cinco minutos.
Tem vontades que passam.
Tem certezas que não são.
Ou são só de quem tem.
Do outro não.
O outro não sou eu.
Junto peça a peça os pedaços de mim que restam do dia.
Muito trabalho ontem.
Antes também.
E uma ansiedade pelas outras coisas.
Todas.
O sono está arisco.
A respiração está igual carro com gasolina batizada.
Mas a garrafa de vinho sorri para mim.



Imagem: http://foodvu.com/content/vine-less-traveled-wine-beginners

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

domingo, 25 de outubro de 2009

você
que a gente chama
quando gama
quando está com medo
e mágua
quando está com sede
e não tem água
você
só você
que a gente segue
até que acaba em cheque
ou em chamas
qualquer som
qualquer um
pode ser tua voz
teu zumzumzum
todo susto sob a forma 
de um sûbito arbusto
seixo solto
céu rovolto
pode ser teu vulto
ou tua volta

Paulo Leminski

terça-feira, 13 de outubro de 2009

12 de outubro





Hoje é dia de
Nossa Senhora da Aparecida.
Ela é Oxum.
Oxum é Rio.
Rio é Água.
Água também é Iansã.
Iansã sou eu.



Fragmento de uma prosa com Marcelo Dev, filho de Ogum e mestre dos magos de outra Santa, mas a Teresa, de um Rio. Venta Iansã que sua filha precisa voar.


Imagem: Acrílica sobre tela, 122x122cm de Marcio Melo www.marciomelo.com .