sábado, 3 de outubro de 2009

A resposta da estante


Como se procurasse um oráculo,
passei o olho na fileira de livros.
Uns meio acabados,
outros cheirando a livraria.
Parei no Leminski
para nao complicar,
para ser curta e grossa,
mas acabei dividida em

"Tres Metades"

Meio dia
um dia e meio
meio dia, meia noite
Metade desse poema
sai na fotografia,
metade, metade foi-se.

Mas eis que a terça metade
aquela que é menos dose
de matemática verdade
do que soco, tiro, ou coice,
vai e vem como coisa
de ou, de nem, ou de quase.

Como se a gente tivesse
metades que não combinam,
três partes, destempestades,
três vezes ou vezes três,
como se quase, existindo,
só nos faltasse o talvez.

Paulo Leminski


sábado, 19 de setembro de 2009

Essa coisa de voar é a maior viagem








É sempre o mesmo ritual. Nas mil filas que temos que passar, confesso para alguém desconhecido que tenho pânico de voar. A pessoa - que provavelmente também tem - diz que o número de acidentes aéreos é bem menor do que os terrestres. É engraçado, parece que realmente acredita que dizendo isso, meu medo vai passar.

Até logo, boa viagem. Agora ao lado de outro desconhecido, o momento sem volta está muito próximo. Melhor pensar em alguma coisa para distrair. Quantos aviões estão no ar naquele momento? Tem até congestionamento aéreo. Fila para sair. Fica até quente e abafado, igual no trânsito. Por quê o meu é que seria o escolhido? Acho que não. Eu nem tive aquelas premonições que dizem que toda pessoa que muda de andar tem. Tranquilo.

Aperte os cintos, cuide da bagagem, dê um sorriso amarelo ao seu vizinho como se fosse descolado e achasse que turbulência até ajuda a embalar o sono. Mas disfarce bem quando for enxugar a mão suada.

Tripulação, decolagem autorizada. Não tem mais volta. Saiu do chão...

Num milionésimo de segundo revejo a toda minha vida e concluo que sou feliz. Umas primeiras lembranças não muito hierarquizadas aparecem. Depois, outras mais óbvias. Bate uma tristeza do que podia ter sido, mas uma sensação de não importar mais. Muita saudade. Saudade de gente, de lugares, de cheiros, de comida, de arrepios, de sofrer de amor, de gozar de amor, de ser feliz, de ser triste, de cantar, de rir, de ir, de vir, de ficar, de sentir saudade.

Se posso olhar pela janela, enfrento o medo. Gosto quando tem o curso de algum rio. Principalmente se for dos grandes. Francisco, Araguaia, Paraguai. Como fazem curvas. Qual a cor. Lembro-me que eles sempre vão pro mar. Acho isso tão bonito, dá saudade de praia também. A mente rapidamente planeja alguma coisa. Se entra no meio da nuvem, perco o ar. D á vontade de puxar as famosas máscaras de oxigênio que graças a Deus até hoje nunca caíram sobre a minha cabeça. Vista liberada. Mudança de paisagem...nossa...obrigada, não tenho asas, mas posso voar!

A cada nova paisagem na memória, mais rumos pedem para ser explorados. Muda o barulho. Alerta, um mal estar. Desacelerou. Tá descendo. Até que foi rápido. Norte, sul, oeste. No leste, o outro mundo. Sai e está fazendo 44 graus. Atravessa duas fronteiras e, ao lado, brinca com neve.

Tripulação, pouso autorizado.

Aperto os cintos. Guardo as idéias. Deixo para depois o planejamento das mil coisas que inventei no espaço entre a certeza absoluta da minha morte naquele vôo e a saudade da vida que ainda quero viver. Aterrisagem completada. Respiro fundo e derreto de felicidade na poltrona, por perceber que gosto de estar com os pés bem firmes no chão. Agora, a minha alma e coraçao é melhor que fiquem mesmo nas nuvens.



sexta-feira, 28 de agosto de 2009

E.T.


Passe lá em casa dia desses
Posso fazer um café,
algum papo pra contar
peço um conselho,
dou o ouvido pra escutar
Sei que quem está sempre
de partida, está sempre
passagem, nem se preocupa
em desfazer as malas:
sempre vai seguir viagem
Então espere um pouco
Descanse e finja que lá
é seu destino final
Aí vou te mostrar
que brincar de me amar 
é bem melhor que voar
em sua nave espacial.


domingo, 28 de junho de 2009




A semana passou e nesse domingo frio o corpo parece em desarmonia com a saúde. O trabalho foi muito, as horas poucas, as contas altas, o amor eu nao sei. Algumas plantas ficaram feias, meio que fazendo uma cara de abandono.  A dona andou em falta com a unica coisa que precisa fazer por elas. Regar. Uns dizem que conversar também faz bem. Acredito. Bem para elas e bem para quem fala; nunca vai ouvir o que pensam. A jabuticabeira parece que entristeceu. Pode ser porque o Michael morreu. Ou é só o inverno mesmo. Ou porque o mundo tem gente demais. Coisa demais. Carro demais. A gente fala demais. Bebe demais. E depois, dirige a vida. Imagine o que não acontece...

Acho que é melhor dar água para as plantas agora.

Imagem: jabuticabeira.




terça-feira, 19 de maio de 2009

O porto



O porto range
suas ferragens enferrujadas
sofrendo docemente.

Sente saudade dos que foram pro mar
Ou a saudade que sente
e' a dos que disseram adeus
e ficaram no continente?

O porto range
a saudade dos amores
de toda gente.


Imagem: Porto de noronha, pena que sem audio.


Dois Irmaos





Vaguei
seguindo pegadas na areia
para achar o caminho

Uma viv'alma apareceu
roubando meu momento
de solidao

Reinventei o destino

Meu pensamento e onda do mar:
Dois Irmaos de sangue
ilhados no mesmo lugar.



Imagem: Noronha. Ilha dos Dois Irmaos do mirante da Baia dos Porcos.




Praia do Sancho




Para todos os Don Quixotes da vida.



Imagens: Noronha. Amiga e companheira Tita.




Pedido ao Deus-Sol










Que o que foi registrado
em palavras ditas e escritas
em folha de papel
assinado e pontuado
com exclamacoes e certezas
fique imovel
no tempo que nasceu.

Feito aquelas fotos antigas
que sao bonitas
porque passaram.



Imagem: Noronha. Hora do descanso do Deus-Sol com a Tita no Forte na Vila dos Remédios.



Chegada





Suite magica de flores e borboletas.

Uma parada cardiaca.

Pulsa?

Sem pulso.

E um mar de distancias

Peixe Star...




Imagens: Noronha....chegada na casa da Tita, minha suite magica e um mar de distancias.

sexta-feira, 1 de maio de 2009

Bom professor


Aquele que contamina o aluno com sua esperança.




Imagem: Fotografia de Stephen Kelen.





Alvo



Eles dizem não,
não se entregue tanto.
Assim têm a ilusão
de que sofrimento
se pode evitar.

Mas quem dirá
que não há sofrimento
em não viver o momento
que só uma entrega
pode criar?

O mundo sempre terá
aqueles que acham
unhas vermelhas bonitas
e outros que acham vulgar.

Então, melhor equilibrar
a paixão do esmalte vermelho,
com a paciencia da espera
do cor-de-rosa, mas
nao faço a menor idéia
aonde isso tudo vai dar.

Na verdade não importa
porque no erro ou no acerto
a gente sempre corre o risco
do amor nos encontrar.



Imagem: Flechas não atingem o lanceiro do bem. Acrílico sobre tela, Assis de Mello (coisasdochico.blogspot.com). Eu espero que algumas sim...

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Imagina



Menina, o mundo ficou bom e nós estamos, finalmente, com todas aquelas sete vidas que merecemos. Que nos prometeram. Imagina que todas as luzes se acenderam e o espetáculo de viver é sempre suave e eterno. E que ninguém tem mais medo de amar e todos agora sabem que são verdadeiros os gestos, os olhares e até os beijos.

Imagina que fomos feitos assim. Para amar. E que há porque chorar. Há, porque as lágrimas respondem aos que são capazes. Aos que têm coragem. E chora-se pela beleza, pela saudade que é torta e há de ser morta. Chora-se pelas encostas da Serra que nos curvamos.

Todas as lágrimas diante a noite, todas as águas restantes do dia.

E, diante de nós, e adiante, e avante, e por todas essas coisas pra frente, fica Ela rindo. E nós não resistimos aos encantos da que nos consome e é, ao mesmo tempo, velha consumida, sorrindo larga e satisfeita para o amor que nos convida.

Imagina que já somos outros, ou ainda os mesmos... E que fomos convidados pela loucura, que nos faz bem; e ao amanhecermos incompletos, feitos de dia, adormecemos no colo, nos ombros, nos cantos da alegria de nos perder, e de nunca ter nos metido á besta de achar que somos feitos de um só tempo. Um só caminho. Uma só verdade.

Beijos, alegrias e poesias,

Djalma Gonçalves.



Imagem: foto minha e do meu querido amigo poeta em momento de boemia num certo buteco, nas encostas da Serra que nos curvamos...

sábado, 21 de março de 2009

Chão meu


Agora que já tenho meu pedaço de chão
posso chorar sem ninguém ver
escondida atrás da mata
na sombra das árvores
em silêncio

Posso trocar a saudade que sinto
pelo barulho do riozinho
que mal nasceu mas já sabe
que o seu único destino é o mar

Posso sentir o cheiro da terra
o aroma das ervas a nascer
o sol esquentando ao amanhecer
e a felicidade que ainda virá acontecer

Agora que tenho meu pedaço de chão...



Imagem: Rivaldo Barboza www.tracosetrocos.wordpress.com

domingo, 15 de março de 2009

Re-começo



É domingo a noite, sozinha, coloco os meus pés para cima, puxo as folhas cheias de escritos para o meu colo e começo a fingir que um vazio feroz nao tomou conta de mim. Penso em você por um segundo e depois me ocupo por mais outros tantos, para que eu não sinta a velha e conhecida auto crítica de me saber uma profunda idiota. Olho sua foto mais uma vez e aplaudo o personagem de o "Amor nos tempos do cólera". Mera tentativa de me justificar nesse mar de amor sem fim.

Quando não me contenho e estico os braços para você me ver lá de longe, vez você estica assunto. Vez se cala para que eu me afunde de novo na estrada infinita da distância. Perco a cor aos poucos, não para você, nem para mim. Sumo à frente desse amor que há tempos se foi, sem deixar de ir.

Questiono meu existir, minha ansiedade. Lamento meu erro tantas vezes repetido, minhas fraquezas e dúvidas. Choro sua saudade e minha vontade. Sinto-me cansada, mas vejo evolução a cada decepção. Entendo aprendizado.

Desvario amando intensa e invariavelmente. Posso até ser o abandono de alguém. Mas você continua sendo o meu. E eu despejo cada gota desse sentimento na minha preparação para o dia de amanha.

Mais uma semana começa e eu ainda penso em você.


domingo, 8 de março de 2009

Para quem gosta do silêncio


Minha boca sussurou
meu amor ao seu ouvido.

Como resposta ouviu-se apenas
o silencio.

E agora essa ausência permanece
congelada.

Enquanto isso você derrete suas lágrimas
por quem atirou o seu amor ao mar.


Imagem: autor desconhecido

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Embriaguez






De tempo em tempo
caminhos se encontram e
nossas estradas se unem
ao sabor do vento

Quem gosta da estrada
não pára de andar,
hoje está aqui, amanhã
em qualquer lugar.

Afinal, o que permanece então?
Um cheiro encaracolado,
embriagando os sentidos,
entorpecendo o coração?

Já que na direção da vida
essa embriaguez tem perdão,
até a Lei Seca da sua ausência
fiquemos bêbados de amor, em vão.




segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Dialeto para uma saudade



Voce é o meu quentinho,
Braço forte me aconchega direitinho
Chega mais perto pra esquentar mais um pouquinho
meus pés que nao gostam de ficar longe dos seus, sozinhos

Toda manha me de um beijo
Mas se for cedo, meu amor, me deixe e saia de fininho
Bem humorada sou demais e posso ate sorrir de mansinho
também me encher de coisa boa pra te dar muito carinho

E nosso amor de tanta poesia terminar sempre em três pontinhos...

Imagem: autor deconhecido.

Pés de férias!


"Sujar os pés de areia pra depois lavar...na água.
Lavar os pés na água pra depois sujar...de areia."
Arnaldo Antunes



Ela estava descendo das nuvens aos poucos, porque é assim que se sente quando tira férias. Férias longas, dessas para esquecer senhas, números, muitos números – salvo as senhas do cartão, porque a parte não muito romântica da história é que tudo tem seu preço e geralmente é bem altinho.

Entrou no banho e mais uma vez pegou um arsenal para tentar limpar os pés que estavam encardidos. Encardidos de férias! Sujos de andar descalços. Sujos de pele nova misturada com pele velha da bolha que se formou na terceira noite de forró consecutivo. Pés de férias!

Tentou, tentou e nada adiantou. Os pés continuavam meio amarelados. E também tinha sujeira nos cantinhos dos dedos. Uma areinha danada que ficava escondida. Ela ficava tentando tirar a areia do cantinho. A cada tentativa entristecia um pouco e nao sabia por quê.

Saiu um grão! Vibrou, depois olhou o grãozinho de areia no pauzinho que estava usando para cutucar o pé. Suspirou. Ficou imaginando em que andanças, em quais areias seus pés se afundaram e carregaram em suas reentrâncias memórias de um tempo feliz. Um tempo feliz de férias. Deu vontade de deixar as sujeirinhas bem quietas lá no canto delas, como um culto ao andar com os pés descalços.

Isso! Um culto à olhar para o céu e saber se o dia seguinte será de sol ou de chuva. Se a maré vai encher ou vai vazar. Se o pescador vai pro mar ou vai ficar. Que fruta é a da estação. Um culto à vida simples. Às nossas origens. Esquecidas.

Ainda bem que ainda existem férias para a gente brincar de ser feliz um pouco. Porque ela, ao constatar que estava de volta a cidade, depois de mais alguns suspiros, teve a cruel constatação: precisava de um salão de beleza para que seu pé ficasse limpo e bonito de novo. E as mãos. E os cabelos. E o trabalho. E o mestrado. E a internet. E o celular. E as contas.

E tudo de novo.


Imagem: foto na beira na barra do rio Caraiva...

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Barra Grande


Grandiosa!

Sua paisagem em policromia
abre os meus sentidos e
barra tudo que não é
encontro de rio com mar.

Só não barra a minha
grande, quase infinita,
sede de amar.


Imagem: fim de tarde no Bar da Rô...braço de mar. E ela desatinou...



quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

Itacaré


Muita gente na rua
Cadê a areia pra pisar?
Ir à praia só de carro?
Eita saudade de andar
Ainda bem que tem
Jeribucaçu de Antônio
Rio, mata e mar também
Logo, logo, pé na estrada
Corre, corre pra Barra Grande
Pra não pensar em nada
Ainda bem.

Imagem: vista na estrada que leva/traz a Itacaré..


domingo, 11 de janeiro de 2009

Caraíva


Rio d'Oxum
Mar à vista, Iemanjá
Rua de areia fofa
Caraíva, felicidade mora lá

Encontro de águas
energia feminina
fertilidade que exala
iluminando cada esquina

Forró, Xote, Baião e Xaxado
de dia ou de noite
numa dança
um novo amor é revelado

Casas coloridas, táxi-carroça
Muqueca e pirão
Ritmo baiano, espera...
Dá até pra fazer uma canção

Os dias se vão
tudo vira lembrança
de saudade o peito se enche
e segue pela Bahia a andança

O próximo destino?
Pode ter rio, pode ter mar
pode ter sol
pode até enluarar

Só não pode deixar
o coração desavisado
bater em disparada
e desatinar...

imagem: foto do "táxi" em Caraíva. Uma feliz entrada em 2009.

domingo, 14 de dezembro de 2008

Repouso


Deixe dormir em paz
o que no passado ficou
que o presente 
se apresenta
com as cores
e sabores da amizade
que tambem alimenta.



Imagem: foto numa tarde chuvosa em Santa Teresa do Rio de Janeiro.

terça-feira, 18 de novembro de 2008

De vento em Pipa


Não se esquece quem é dono de qual lado da cama, mas é até perdoável, já que a arte de dormir junto é para poucos dois em um que às vezes se encontram por aí.É claro que a linha imaginária funciona muito bem para definir as regiões climáticas do planeta, mas não é muito eficiente para impor limites ou definir a temperatura do coração.

Dormir junto é permitir que essas linhas sejam cruzadas, que a pulsação e a respiração sejam conhecidas e se algo muda, alguém vai querer saber o por quê. Aquele que mudou pode responder, ou simplesmente não dizer nada e esse silêncio pode ser confortante ou irritante, dependendo do número de voltas que o pensamento tiver dado nesse círculo de amor. Ou os pés também podem se procurar no fim da cama, como um jeito de apaziguar até mesmo o que já é somente ternura. Depois o sono vem para silenciar ainda mais a quietude, deixando só o assobio do vento embalando os sonhos.

O que importa se os pensamentos às vezes se afastam para outros suspiros? Importa muito, porque os cabelos cheirosos como o cacho de caju daquela árvore lá da praia, esteve tantas vezes enrolados nos meus dedos e grudados na pele suada de amor, que é difícil imaginar outras mãos a afagá-los. Mesmo imaginando, é possível apostar que em outros cantos, o cheiro não é o mesmo . Em cada olfato um registro, uma memória. Ganhará a memória que não se findar?

O cajueiro ainda estava florido. Ainda há frutos para dar. Contudo nem as grandes falésias foram capazes de guardar seus pensamentos num só lugar. Grande ilusão seria, os cajus nem maduros estão...Mas no meio do azul, dividido entre céu e mar e um punhado de sol refletido no seu rosto sorrindo ao me olhar, dava até para acreditar que ao cair da noite, você haveria de se entregar. Eu só tinha a espera para lhe dar.

A sua entrega e a minha espera continuaram estáticas, talvez por um cansaço, talvez por medo, talvez por uma saudade. Então, como a lua minguante que vimos nascer, pego a estrada e vou sumindo devagarinho e aos poucos você nem vai se lembrar que eu disse que viveria um grande amor, desses que nos fazem mudar o prumo, mudar de rumo, porque quando os golfinhos não apareceram, deram o sinal de que esse amor só viveu de vento em Pipa.


Imagem: Soltando pipa
Ricardo S. R. Costa

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Boa noite


Eu agora vou com
a lua

Procurar em algum lugar
da rua

Qualquer lembranca
sua

imagem: Mulher e passaro ao luar - Joan Miro (1893-1983)



segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Andarilhos no sertão

Andarilhos do sertão,
agora sobre rodas.
Não aquelas que carregam
carroças, trouxas e gentes,
mas as outras que nelas
se equilibram sonhadores.
Passa boiada, passa chão
a fina chuva que caiu
fez brotar o verde claro
dos pequizeiros que derramam
flores e beleza na terra,
terra seca do sertão.
Na esquina, numa encruzilhada
uma casa abandonada.
Mesmo com o bobo medo
de gente já morrida,
adentramos na casa que
um dia já teve vida.
Que surpresa linda
ao entrar e ver a marca de
um quadro negro na parede;
era uma escola do sertão
no meio da estrada,
no meio do nada.
Na volta da andança,
o sol esticava seus raios,
a terra brilhava dourada.
Gente simples que passava
acenava encantada
pelos andarilhos com roupas
coloridas, em cima de
suas carroças urbanas,
que precisam de pernas
para alcançar os sonhos.
E na vida, de sonhar
é a unica coisa que nao se cansa.


segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Presente do Indicativo



Penso em você, é claro,
quando o frio bate
e a minha nuca, agora nua,
está longe das suas mãos,
que a aquecem e acendem
a paixão de ter você, enfim.

Penso no vazio que sinto
quando, por não me entender,
eu mesma o afasto e vejo
os lençóis desarrumados
marcando contornos do seu corpo,
que mora ali quando sou amorosa.

Penso nas cores que irradiam
da sua presença, nas flores
vermelhas dos meninos
de Liverpool, no verde da
samambaia, no furta-cor rítmico
cintilante, brilhante,
que exala da sua vocação
em tocar meu coração.

Penso em não soltar
as suas mãos que afagam
a minha dor, que se juntam
como se quisessem me dar
um pouco de ar para beber,
quando de noite o sono
tenta me golpear em alerta.

Penso na minha insistência
em permanecer imperfeita,
e no medo de, por estúpidas ilusões,
ter certeza do contrário e
acabar deixando escorrer,
esvair a única fonte do
verdadeiro amor que conheci
desde que a vida me deu você.



domingo, 7 de setembro de 2008

Meio Tom



As nuvens vão chegando
Abraçando as montanhas
A multidão caminhando
Cada qual com sua solidão

Pingos, frios, não se importam
Começam a cair fazendo os passos
Se apressarem entre os prédios
Arranha-montanhas e céus

O cinza descolore traços
Enquanto passos procuram marquises
A água cai, pesada vai
Molhando felizes e tristes

Mas em algum lugar da cidade
Ainda deve existir um jardim
Onde esteja chovendo na roseira...



Canção com Beto Lopes